Folha: Cofundador do MCCE considera incorreta a decisão do Supremo em diminuir poder do Tribunal de Contas na aplicação da Ficha Limpa

Folha: Cofundador do MCCE considera incorreta a decisão do Supremo em diminuir poder do Tribunal de Contas na aplicação da Ficha Limpa

Foi correta a decisão do STF de diminuir poder do Tribunal de Contas na aplicação da Ficha Limpa? NÃO

Márlon Reis (17/09/2016)

 

AUTONOMIA GARANTIDA POR LEI

O artigo 14 da Constituição Federal determina que o legislador complementar tem o dever de estipular hipóteses de inelegibilidade com o objetivo de proteger a moralidade administrativa e a probidade para o exercício do mandato.

O Congresso Nacional estava em dívida com o cumprimento dessa missão, o que levou a sociedade a apresentar um projeto de lei de uma iniciativa popular. Nascia assim a Lei da Ficha Limpa.

Pela nova regra, chefes do Executivo que sejam ordenadores de despesa e tenham suas contas técnicas rejeitadas ficam impedidos de participar de novas eleições.

Quando um prefeito opera diretamente, movimentando dinheiro público, despe-se de seu papel de governante para exercer o de mero ordenador de despesas. Atua nessa condição toda e qualquer autoridade cujos atos resultem em emissão de empenho, autorização de pagamento, suprimento ou dispêndio de recursos da União, dos Estados e dos municípios.

O papel do chefe do Executivo não é realizar tais atividades. Há exemplos, sobretudo nos municípios menores, de prefeitos que levam consigo o talonário de cheques com o qual movimentam, sem qualquer solenidade, os valores econômicos pertencentes ao erário.

Tais casos são inconcebíveis em uma administração dotada de um mínimo de organização, formalismo e respeito às normas.

A persistência dos prefeitos nas funções descritas aqui pode ser explicada pela corrupção e pela cultura da concentração de poderes.

Por isso, o legislador popular quis desestimular tais manobras, fazendo com que a inelegibilidade incida desde o momento em que o Tribunal de Contas se manifestou contra a aprovação.

Esse pronunciamento, dotado de força decisória e apto a imputar ao gestor o dever de restituir os valores indevidamente aplicados, deve ser capaz de gerar restrição à elegibilidade de todos os responsáveis, inclusive os chefes do Executivo.

Contas de governo, ou políticas, devem sujeitar-se a julgamento parlamentar; contas de gestão, ou técnicas, demandam julgamento pelo Tribunal de Contas. Trata-se de lição primária no universo das finanças públicas.

Mas ainda que tal regra fosse ignorada, não se poderia abrir mão de outra perspectiva: a palavra do Tribunal de Contas foi a escolhida pelo legislador para a definição da inelegibilidade. Foi esse o critério objetivo, a marcar a vida de administradores ímprobos, determinado pela Lei da Ficha Limpa, pouco importando, a esse respeito, quais os parâmetros constitucionais para a apreciação final da matéria.

Assim como, nas condenações judiciais, a Lei da Ficha Limpa se contentou com as proferidas por órgão colegiado, também neste tema deu-se uma inovação, afirmando-se com clareza extrema que a inelegibilidade do ordenador de despesas, esteja ele ou não investido no cargo eletivo de chefe do Executivo, dependerá tão somente do pronunciamento negativo do Tribunal de Contas.

 

 

MÁRLON REIS, advogado eleitoral, é cofundador do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral e um dos idealizadores da Lei da Ficha Limpa

 

 

Fonte: folha.uol.com.br

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